quarta-feira, novembro 29, 2006

Fernando Pessoa , com todas as letras e como sempre em dose dupla:


Foi um momento


Foi um momento
O em que pousaste
Sobre o meu braço,
Num movimento
Mais de cansaço
Que pensamento,
A tua mão
E a retiraste.
Senti ou não ?

Não sei.
Mas lembro
E sinto ainda
Qualquer memória
Fixa e corpórea
Onde pousaste
A mão que teve
Qualquer sentido
Incompreendido.
Mas tão de leve !...

Tudo isto é nada,
Mas numa estrada
Como é a vida
Há muita coisa
Incompreendida...

Sei eu se quando
A tua mão
Senti pousando
''Sobre o meu braço,
E um pouco, um pouco,
No coração,
Não houve um ritmo
Novo no espaço ?
Como se tu,
Sem o querer,
Em mim tocasses
Para dizer
Qualquer mistério,
Súbito e etéreo,
Que nem soubesses
Que tinha ser.

Assim a brisa
Nos ramos diz
Sem o saber
Uma imprecisa
Coisa feliz. .



AUTOPSICOGRAFIA

O poeta é um fingidor.
Finge tão completamente
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente.

E os que lêem o que escreve,
Na dor lida sentem bem,
Não as duas que ele teve,
Mas só a que eles não têm.

E assim nas calhas de roda
Gira, a entreter a razão,
Esse comboio de corda
Que se chama o coração.

terça-feira, novembro 28, 2006

"É bom gostar de alguém
que tenha os pés no chão, assim,
quando esse alguém te faz voar,
você tem onde se segurar

pode até ser meio
contraditório o jeito
que a mesma pessoa
que te manda para as alturas
seja a mesma que te segura no chão
mas afinal, desde quando o amor é coerente?"

de um poeta das quadradezas...

segunda-feira, novembro 27, 2006

Melhor música que eu já ouvi na voz do cazuza, confira.


Luz Negra
Cazuza
Composição: Nelson Cavaquinho e Irani Barros

sempre só
eu vivo procurando alguém
que sofra como eu também
mas não consigo achar ninguém

Sempre só
E a vida vai seguindo assim
Não tenho quem tem dó de Mim
Tô chegando ao fim

A luz negra de um destino Cruel
Ilumina um teatro sem cor
Hoje eu tô representando o Papel
Do palhaço do amor

Sempre só E a vida vai seguindo...
vai Seguindo assim
Não tenho quem tem dó de Mim
Tô chegando ao fim

A luz negra de um destino Cruel
Ilumina um teatro sem cor
Hoje eu tô representando o Papel
Do palhaço do amor

Sempre só
E a vida vai seguindo assim
Não tenho quem tem dó de Mim
Eu tô chegando ao fim

Eu tô chegando ao fim
Eu tô chegando ao fim
Eu tô chegando ao fim

domingo, novembro 26, 2006

Texto legal do Rubem Braga, grande escritor... "vou humildemente filar uma fatia de presunto e de alegria na casa de uma família amiga." Criativo e suave, como a fatia de presunto e de alegria, se é que alegria pode-se cortar em fatias.


Natal

Rubem Braga
É noite de Natal, e estou sozinho na casa de um amigo, que foi para a fazenda. Mais tarde talvez saia. Mas vou me deixando ficar sozinho, numa confortável melancolia, na casa quieta e cômoda. Dou alguns telefonemas, abraço à distância alguns amigos. Essas poucas vozes, de homem e de mulher, que respondem alegremente à minha, são quentes, e me fazem bem, "Feliz Natal, muitas felicidades!"; dizemos essas coisas simples com afetuoso calor; dizemos e creio que sentimos; e como sentimos, merecemos. Feliz Natal!

Desembrulho a garrafa que um amigo teve a lembrança de me mandar ontem; vou lá dentro, abro a geladeira, preparo um uísque, e venho me sentar no jardinzinho, perto das folhagens úmidas. Sinto-me bem, oferecendo-me este copo, na casa silenciosa, nessa noite de rua quieta. Este jardinzinho tem o encanto sábio e agreste da dona da casa que o formou. É um pequeno espaço folhudo e florido de cores, que parece respirar; tem a vida misteriosa das moitas perdidas, um gosto de roça, uma alegria meio caipira de verdes, vermelhos e amarelos.

Penso, sem saudade nem mágoa, no ano que passou. Há nele uma sombra dolorosa; evoco-a neste momento, sozinho, com uma espécie de religiosa emoção. Há também, no fundo da paisagem escura e desarrumada desse ano, uma clara mancha de sol. Bebo silenciosamente a essas imagens da morte e da vida; dentro de mim elas são irmãs.
Penso em outras pessoas. Sinto uma grande ternura pelas pessoas; sou um homem sozinho, numa noite quieta, junto de folhagens úmidas, bebendo gravemente em honra de muitas pessoas.

De repente um carro começa a buzinar com força, junto ao meu portão. Talvez seja algum amigo que venha me desejar Feliz Natal ou convidar para ir a algum lugar. Hesito ainda um instante; ninguém pode pensar que eu esteja em casa a esta hora. Mas a buzina é insistente. Levanto-me com certo alvoroço, olho a rua e sorrio: é um caminhão de lixo. Está tão carregado, que nem se pode fechar; tão carregado como se trouxesse todo o lixo do ano que passou, todo o lixo da vida que se vai vivendo. Bonito presente de Natal!

0 motorista buzina ainda algumas vezes, olhando uma janela do sobrado vizinho. Lembro-me de ter visto naquela janela uma jovem mulata de vermelho, sempre a cantarolar e espiar a rua. É certamente a ela quem procura o motorista retardatário; mas a janela permanece fechada e escura. Ele movimenta com violência seu grande carro negro e sujo; parte com ruído, estremecendo a rua.

Volto à minha paz, e ao meu uísque. Mas a frustração do lixeiro e a minha também quebraram o encanto solitário da noite de Natal. Fecho a casa e saio devagar; vou humildemente filar uma fatia de presunto e de alegria na casa de uma família amiga.

sábado, novembro 25, 2006

As visitas desse blog, que já eram zero, caíram pela metade, então dedico os esses grandes poemas para todas as pessoas que não vão ler, para ser ainda mais coerente.

Tenho Tanto Sofrimento


Tenho tanto sentimento
Que é freqüente persuadir-me
De que sou sentimental,
Mas reconheço, ao medir-me,
Que tudo isso é pensamento,
Que não senti afinal.

Temos, todos que vivemos,
Uma vida que é vivida
E outra vida que é pensada,
E a única vida que temos
É essa que é dividida
Entre a verdadeira e a errada.

Qual porém é a verdadeira
E qual errada, ninguém
Nos saberá explicar;
E vivemos de maneira
Que a vida que a gente tem
É a que tem que pensar.



O Amor Quando se Revela


O amor, quando se revela,
Não se sabe revelar.
Sabe bem olhar p'ra ela,
Mas não lhe sabe falar.

Quem quer dizer o que sente
Não sabe o que há de dizer.
Fala: parece que mente
Cala: parece esquecer

Ah, mas se ela adivinhasse,
Se pudesse ouvir o olhar,
E se um olhar lhe bastasse
Pra saber que a estão a amar!

Mas quem sente muito, cala;
Quem quer dizer quanto sente
Fica sem alma nem fala,
Fica só, inteiramente!

Mas se isto puder contar-lhe
O que não lhe ouso contar,
Já não terei que falar-lhe
Porque lhe estou a falar...


os dois poemas são de Fernando Pessoa

quinta-feira, novembro 23, 2006

Deus me fez o que sou porque quem eu era não iria ser o que fui. Confuso, mas muito mais simples do que muita coisa e do que muita gente. Gente que joga fora ouro, come diamantes e pindura cobertores nas árvores só porque acha bonitinho. Paradoxalmente fascinante que essas pessoas que gospem a verdade são as mesmas que ainda fazem coisas nobres. E mais contrastante do que a televisão e o bem é a maneira que os bons fazem o mal. Somos um bando de divididos! Nem os bons, nem os mals conseguem fazer o que querem, sempre sobra um pouco de um no outro e um pouco d'outro no um. Só os ignorantes tem o poder, o dom, de fazer o mal achando que fazem o bem. Ai, esses ignorantes, não é possível que as pessoas nasçam assim. São como são porque querem ser o que são. Gostar da própria ignorância para justificar a covardia das atitudes insanas é a verdadeira ignorância. Sei lá, entendeu? Podem até ser meio profundas essas coisas todas que você leu e não entendeu mas se não fossem assim não teriam valor! Comente o texto e seja feliz.

quarta-feira, novembro 22, 2006

Se estamos falando de poesia, aqui vai uma conhecida, nem por isso menos surpreendente, incrível, linda.

“De tudo, ao meu amor serei atento
Antes, e com tal zêlo, e sempre, e tanto
Que mesmo em face do maior encanto
Dele se encante mais meu pensamento.

Quero vivê-lo em cada vão momento
E em seu louvor hei de espalhar meu canto
E rir meu riso e darramar meu pranto
Ao seu pesar ou seu contetentamento.

E assim, quando mais tarde me procure
Quem sabe a morte, angústia de quem vive
Quem sabe a solidão, fim de quem ama

Eu possa me dizer do amor (que tive):
Que não seja imortal, pôsto que e chama
Mas que seja infinito enquanto dure.”


Vinicius de Moraes - Soneto da fidelidade

terça-feira, novembro 21, 2006

O Mundo É Um Moinho
Cazuza
Composição: Cartola

Ainda é cedo amor,
mal começaste a conhecer a vida,
já anuncias a hora da partida,
sem saber mesmo o rumo que irás tomar.

Presta atenção querida,
embora eu saiba que estás resolvida,
em cada esquina cai um pouco a tua vida,
em pouco tempo não serás mais o que és.

Ouça-me bem amor,
preste atenção,
o mundo é um moinho,
vai triturar teus sonhos tão mesquinhos,
vai reduzir as ilusões à pó.

Presta atenção querida,
de cada amor tu herdarás só o cinismo,
quando notares estais a beira do abismo,
abismo que cavastes com teus pés.

domingo, novembro 19, 2006

Eu quero a sorte de um amor tranqüilo
Com sabor de fruta mordida
Nós, na batida, no embalo da rede
Matando a sede na saliva
Ser teu pão, ser tua comida
Todo amor que houver nessa vida
E algum trocado pra dar garantia
E ser artista no nosso convívio
Pelo inferno e céu de todo dia
Pra poesia que a gente nem vive
Transformar o tédio em melodia...
Ser teu pão, ser tua comida
Todo amor que houver nessa vida
E algum veneno anti-monotonia...
E se eu achar a tua fonte escondida
Te alcanço em cheio
O mel e a ferida
E o corpo inteiro feito um furacão
Boca, nuca, mão e a tua mente, não
Ser teu pão, ser tua comida
Todo amor que houver nessa vida
E algum remédio que me dê alegria...
Ser teu pão, ser tua comida
Todo amor que houver nessa vida
E algum trocado pra dar garantia
E algum veneno anti-monotonia...

Cazuza

terça-feira, novembro 14, 2006

Minha Primeira Cacaca

Estava eu no ônibus quando o impossível, o inacontecível acontece mais uma vez.Uma linda moreninha de pequenos anos de idade e caracóis claros de cabelo tinha uma atitude capaz até de derrubar uma máscara. Máscara essa do tipo que o medo coloca nos homens. Doce Ilusão. A menina no ônibus gritou "Cacaca"! A mãe disse "Onde filinha?". Ninguém viu nada. A criança demorou alguns segundos e gritou novamente a mesma coisa. Só que dessa vez, ela foi rápida o bastante para flagrar com boa precisão um homem com seu dedo escondido dentro do ouvido. O dedo ia tão fundo que parecia que ia sair pelo outro ouvido. O homem já era careca e tinha legítimaos bigodes, no sentido mais amplo e generoso da palavra. Eles iam até o queixo. Ao ouvir o grito de alarme da criança ( o segundo Cacaca) ele fez um movimento giratório com a mão, quase tão preciso quanto o dedinho da criança que apontava para ele. Ao perceber que aquele segundo grito havia feito todo o ônibus olhar fixamente para ele, ele removeu rapidamente o enorme dedo ( que só perdia em tamanho para o seu PEQUENO bigode) de dentro do ouvindo.
A pequena menina havia capturado o momento perfeito, exatamente no ápice do movimento de limpar o ouvido. Sem dó nem piedade a criança deixou o velho tão envergonhado que ele fez aquela cara de "Problema meu !, ninguém tem nada com isso , limpo meu ouvido com o dedo mesmo e não estou preocupado com o que os outros pensam!". A criança não teve nem dó nem piedade, cruel menina pobre homem.

domingo, novembro 12, 2006

Uma vez disse alguém algo mais ou menos parecido com isso:O fato de ser humano é algo que pode fazer o mais nobre rei se entristecer e chorar ou a mais humilde pessoa se alegrar e festejar. De alguma forma a vida continua, de alguma forma todos parecem felizes e todos choram. Cada um de um jeito, tão iguais e tão diferentes. E esse contraste é o que faz de cada coisa boa, melhor e cada coisa ruim tão incompreensível. É ainda mais esquisito pensar que alguns pequenos são maiores que alguns grandes e que o 'ser' é 90% vontade e 10% capacidade. Sei que o sol nasce todas as manhãs,que as árvores ainda não estão cinzas e que também não estão dispostas a deixarem de ser verdes. Os pássaros cantam! E quão feio é o mais belo pássaro que não é capaz de cantar ou quão belo é o mais feio que canta. Não sou nem um bom filósofo, se é que existe algum, e muito menos, bem menos, um bom escritor. Só queria contar para você que a tristeza, apesar de ser útil de vez em quando, pode ser mais feliz se você quiser. A dor, os problemas sempre vão existir mas os sorrisos também. A felicidade verdadeira não está em momentos mas sim na vontade de perceber sempre o lado bom da vida. Esse lado pode ser difícil de encontrar, e ele não te priva nem da dor, nem do sofrimento mas ele está sempre ali, mesmo que de uma forma que não entendamos.
Obrigado por ler, nos visite mais vezes!