quinta-feira, setembro 13, 2007

Conto do Renan, um pouco longo... Mas é muito bom!!

Uma história corriqueira

- O quê?! Exclamou com surpresa o Finado Zacarias.Não que fosse realmente finado. Pelo menos não no sentido literal do termo. Finado Zacarias era seu nome de Batismo. Batismo, seu pai, achou o nome tão bonito que não resistiu quando viu o recém nascido. O nome casava com o novo indivíduo.Finado Zacarias nunca teve grandes ambições na vida. Finado Zacarias era um tipo meio lhama. Lhamas não têm grandes ambições. Se bem que ele nem tinha consciência disso.Afinal, nunca vira um desses animais. Os Andes ficavam muito longe. Finado Zacarias não tinha tempo para isso. Tinha que se preocupar com a vida.

Todos os dias, levantava-se às 5 horas da manhã. Não que tivesse algo de importante para fazer, ou que tivesse horários a cumprir. Apenas acordava. Por acordar. E sem nem saber por quê. Nunca lhe explicaram o porquê de muitas coisas. Às 10 horas saía de casa. Dava um volta metódica no quarteirão. Acenava para a dona da padaria. Sorria para o limpador de rua que passava por ali. Quando voltava para casa, 10 minutos mais tarde, Finado Zacarias surpreendia-se com o tempo que passara fora. Quanta coisa fizera!Almoçava cerimonialmente às 11. Trocava-se e ia para loja vender parafusos. Algumas vezes lembrava de se despedir de Alegria, sua esposa.

Alegria sim era uma mulher pacata. Distinta e austera. Indômita e resignada. Alegria era a mulher que todo homem desejaria ter. Jamais deixara de cumprir seus deveres de dona do lar. Servia-se de trouxas de roupas, pilhas de louça e tapetes sujos. Que grande louvor lhe brotava no coração ao ter tais artefatos com que se ocupar. Limpava toda a casa três vezes por semana. Preparava o almoço todos os dias. Com destreza e péssima mão. Raramente seus preparos tinham sabor agradável. Mas como Finado Zacarias, seu marido,nunca sentira gosto, Alegria contentava-se com seu despreparo culinário.

E Finado Zacarias vendia parafusos. Para muitos um serviço monótono. Para ele não. Interessava-se pelas formas e tamanhos diversos desses objetos. E divagava. Conjecturava se após ser colocado num buraco na parede e permanecer ali por anos, o parafuso ainda seria o mesmo. Afinal, pensava Finado Zacarias, deve ser frustrante ser sempre o mesmo.

Assim, Alegria e Finado Zacarias eram casados há 23 anos. Não que sejam precisamente 23 anos. Nem mesmo eles o sabiam, mas assim diziam para registro de ocasiões formais. 23 era um número que aprazia a ambos. 2 para Finado Zacarias. 3 para Alegria.

Dois sonhos: conhecer o Relógio das Flores, em Curitiba; comer gelatina verde com pedaços de maçã. Três anseios: amor, felicidade e um par de meias cor de rosa.Dois empecilhos: a distância de sua casa em Pinhais a Curitiba; maçã com casa gera flatos.Três medos: ser amada, sorrir e ter que usar vestido quando tivesse o par de meias cor de rosa.

Diante de todas essas circunstâncias, Finado Zacarias ainda estava lá. Parado na frente do feirante:- O quê?!- Isso mesmo, seu Finado. Cinco reais o quilo da cebola.- Pois não compro.- Ora! Então não compre!- Mas isso é um absurdo!- Absurdo?! Desde quando?- Como desde quando! O quê!

Finado Zacarias, tinha mania de repetir, com diferentes entonações, "o quê", quando se algo lhe perturbava. Por isso, sempre andava pela rua dizendo: "O quê?! O quê! O quê??". Com acento circunflexo e tudo.

Neste dia, sua crise de o quês foi complementada por um acesso de piscadelas ritmadas. Quando jovem, Finado Zacarias dançava lambada. Até o dia em que, num concurso, escorregou na barra da calça boca de sino e foi parar no meio do salão. Estirado. Com a perna quebrada. Deixando aparecer a cueca alaranjada que usava para dar sorte. O trauma foi tanto que nos momentos de maior indignação, Finado Zacarias tinha piscadelas no ritmo da lambada-da-morte, como gostava de lembrar. No dia do incidente, Alegria estava no salão. Ao ver o dançarino no chão, não teve dúvidas de que era o homem de sua vida. Casaram-se duas semanas depois.

Atravessava a rua, Finado Zacarias. Num intervalo de olhos fechados de seu acesso de piscadas, foi atropelado. Morreu ali. Rindo-se de tanto contentamento: o caminho da funerária passava pelo Relógio das Flores. Há anos preparara uma carta dizendo que em seu velório deveria ser servida gelatina verde com pedaços de maçã. Ria-se só de imaginar a sinfonia flatulêncial que seria na hora do sepultamento.

Alegria, ao saber do ocorrido, preparou 4 caixas de gelatina verde com pedaços de maçã. Saiu. Comprou um par de meias cor de rosa. Voltou para casa. Tirou uma foto sorrindo. Escreveu uma carta de amor. Pulou semi-nua da sacada do sobrado. Semi-nua: usava um par de meias cor de rosa.

5 comentários:

Anônimo disse...

Nossa...
quanta criatividade..
hehehehe
Beto meu flog mudou de endereço...
é www.vibeflog.com/dehkioshima
abraços...

Unknown disse...

pode drê..
bom mesmo..
parabéns renan..

hujes...

Unknown disse...

*crê

Miguel Del Castillo disse...

caramba... mto bom.
meus parabenes
fiquei com vontade de comer gelatina verde com pedaços de maçãs
uhuhuhu

Anônimo disse...

Nuss...mto bom Renan!!!
escreve mtooo bem!^^
Parabéns msm!
=**

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